sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Dez de 2014 - Massan

Quando grandes mudanças chegam em nossas vidas, como morar no exterior por alguns anos, é comum fazermos muitos planos. Contatar família e amigos frequentemente, manter exercícios regulares, alcançar fluência na língua local, viajar o máximo possível... Acontece que quando a nova rotina começa, alguns planos acabam ficando para trás, como manter os blogs atualizados. Mas nunca é tarde para recomeçar... Como meta para 2015, pretendo reativar esse blog e contar um pouquinho sobre a minha vida aqui no Japão. 

Essa semana eu tive a oportunidade de visitar o estúdio de Osaka da NHK, a organização nacional de radiodifusão pública do Japão. Em parceria com a Universidade onde estudo, eles ofereceram um tour pelos estúdios e uma pequena palestra sobre o design nas produções audiovisuais da empresa. Localizada em um prédio de 17 andares com vista para o Castelo de Osaka, além de noticiários e programas de entretenimento em geral, eles também produzem "dramas", o equivalente às nossas novelas, mas com alguma diferenças. 

Estúdio da NHK em Osaka

A palestra foi feita utilizando um "quadro branco interativo" (algo como um ipad do tamanho de uma televisão de umas 50 polegadas), com imagens dos planejamentos dos cenários, vestimentas, etc. Também pudemos ver os cenários de diversos programas de televisão, assim como do mais recente drama produzido pela emissora: Massan (マッサン). A história se passa na década de 20, portanto, o departamento de design teve bastante trabalho para criação dos cenários e caracterização dos personagens. É claro que fotos eram proibidas.

Depois dessa tão interessante visita, decidi assistir o drama. Fala sobre o casamento de um homem japonês com uma mulher escocesa, no Japão da década de 20, uma época em que casamentos inter-culturais eram ainda mais raros que nos dias de hoje. Eles lutam contra o preconceito da família, dos conhecidos e de toda a sociedade. Em mais de um momento Ellie, a personagem escocesa, escuta a seguinte frase: "não importa o que você faça, você nunca será japonesa".



Mesmo que a história se passe há quase 100 anos atrás, nem todas as dificuldades passadas pelas personagens são passado. O fato de que um estrangeiro jamais se tornará um japonês é um fato. Não é possível mudar o país de origem de uma pessoa. Mas o significado da frase é mais profundo que isso. 
Em países miscigenados como o Brasil, a mistura de raças faz com que a aparência física da população seja muito variada, ou seja, não há uma tipo padrão. Porém, o Japão é um dos países de raça mais pura. É possível reconhecer um japonês de longe, apenas pela vista. Num mar de rostos e corpos semelhantes, um estrangeiro se destaca pela cor dos olhos, da pele, do cabelo, pelo formato do corpo, pela altura, pela maneira de se vestir. 

Mesmo depois de mais de um ano e meio vivendo em Kobe, uma cidade portuária, considerada como uma das mais internacionais da região de Kansai, toda vez que saio de casa sou observada e encarada pelos japoneses. O motivo? Talvez seja curiosidade, talvez estranhamento. Às vezes pode ser lisonjeiro, mas na maioria das vezes é desconfortável. A verdade é que não importa o que eu vista, não importa o que eu faça, eu sempre serei diferente deles. Eu, assim como qualquer estrangeiro de aparência ocidental, jamais será confundido com um japonês. E, portanto, nunca será parte real da sociedade. Pode ser bastante frustrante viver em uma cultura na qual ser aceito é uma grande dificuldade.


Vídeo "Mas nós estamos falando japonês!" (em inglês e japonês)

É claro que existem os japoneses abertos a novas culturas, que recebem estrangeiros muito bem. Logo que cheguei ao Japão, foi com a ajuda de muitos japoneses dispostos que consegui realizar tarefas básicas como abrir uma conta no banco, comprar um cartão para utilizar o trem, entender o contrato para aluguel de um apartamento, ligar o registro de água, etc. Mesmo aqueles que têm medo ou vergonha de falar com estrangeiros, devido à grande dificuldade com outras línguas, fazem todo o seu possível para ajudar alguém que esteja precisando. Se pedir ajuda para encontrar uma loja ou um ponto turístico para um policial, ou mesmo para algum estranho na língua, após o susto inicial, eles usarão as poucas palavras que sabem em inglês, mímica ou até levá-lo pelo braço até seu destino. Não há como negar a disposição dos japoneses. E entre eles, estão àqueles que se aproximam, que apóiam, que fazem o seu melhor possível para acolher e criar laços de amizade. 

A grande questão é, em uma sociedade em que a grande maioria ainda vê estrangeiros como forasteiros, um pequeno grupo de amigos e apoiadores é suficiente para viver uma vida feliz? A resposta dessa pergunta vai depender de cada um.